A corrida das grandes varejistas pela moda sustentável
Produzir peças bonitas, que acompanhem as trends do momento e que tenham boa qualidade não é mais o suficiente para as grandes varejistas que disputam a preferência do consumidor. Mais que isso, o desafio da indústria têxtil é praticar a moda sustentável.
A confecção de roupas seguindo os critérios ESG (environmental, social and corporate governance – ambiental, social e de governança corporativa, em português) cada dia mais tem se tornado uma exigência dos consumidores modernos, que estão de olho nos impactos que as grandes marcas do setor da moda têm sobre o meio ambiente, e utilizam de seu poder de compra e decisão para cobrar das organizações do ramo mais responsabilidade e transparência no processo.
Moda sustentável: uma exigência do planeta
Você sabia que uma calça jeans comum consome cerca de 48,8 litros de água durante o processo de lavagem? Considerando que os primeiros pares da peça datam de 1792 e que hoje deve haver pelo menos dois exemplares no seu guarda-roupa, imagine quantos litros de água já foram utilizados durante a existência de uma das peças mais democráticas da moda.
Não à toa, a indústria têxtil figura no ranking elaborado pela ONU Meio Ambiente, agência da Organização das Nações Unidas, como o segundo setor que mais consome água e produz residuais, contabilizando espantosas 500 mil toneladas de microfibras sintéticas despejadas nos oceanos todos os anos.
E não para por aí: a estimativa da organização intergovernamental aponta ainda que a confecção de roupas responde por cerca de 10% do total de emissões de gases-estufa, quantidade maior que o transporte marítimo e aéreo juntos.
Para piorar a situação, o relatório da ONU Meio Ambiente destaca que, todo ano, se perdem cerca de 500 bilhões de dólares – o equivalente a 2,5 trilhões de reais – com o descarte de roupas em aterros e lixões.
Diante destes dados, não é preciso saber prever o futuro para entender que manter esse ritmo é algo insustentável para a vida no planeta. Esse entendimento, aliás, passou a fazer parte dos critérios de escolha dos consumidores, que cobram as marcas por quesitos que vão além da qualidade e durabilidade das peças: envolvem a moda sustentável.
Fernanda Campos, Diretora de RH, Pessoas & Inovação na C&A Brasil, confirma essa tendência e explica que práticas de sustentabilidade, transparência e coerência de discurso e atitude são valores cada vez mais presentes no processo decisório de compra do consumidor.
“Ao mesmo tempo que a cliente procura uma marca que inove e que traga o melhor da moda e estilo, ela prioriza as empresas em que confia em diferentes sentidos, desde a qualidade da roupa que ela deseja até a forma como a companhia extrai os recursos naturais usados para confecção de uma calça jeans, por exemplo. Acreditamos, portanto, que a demanda por uma moda ainda mais pessoal, com dimensão de consciência e sustentabilidade e de responsabilidade em linha com os critérios ESG seja cada vez maior”, pontua.
Produção sustentável
A C&A é uma das grandes varejistas do setor têxtil que vêm incluindo a moda sustentável em sua pauta, elaborando estratégias que tenham como objetivo minimizar o impacto da produção no meio ambiente.
“Mais de 90% dos produtos de algodão comercializados pela C&A contam com matéria-prima adquirida como mais sustentável. Além disso, somos a primeira varejista a oferecer uma coleção Cradle to Cradle Certified® Gold – certificação internacional que garante que cada peça foi desenvolvida com materiais e produtos seguros, circulares e feitos de forma responsável. Trata-se da coleção Ciclos, produzida com algodão mais sustentável e insumos químicos seguros, além de fomentar o uso de energia renovável e a gestão de água no processo de produção”, explica a diretora de RH, Pessoas & Inovação na C&A Brasil.
A redução no consumo de insumos, aliás, é o carro-chefe das ações de sustentabilidade da marca, que em março deste ano lançou sua segunda coleção cápsula de jeans, com redução no uso de água no processo de lavanderia de 80% – índice superior aos alcançados na 1ª coleção lançada em 2020.
“Na prática, por meio de um algoritmo de cálculo o software EIM (Environmental Impact Measuring) o volume de água, energia e químicos usados em cada lavagem de uma calça, jaqueta ou outra qualquer peça jeans na etapa de lavanderia é controlada com precisão. Isso poupa tempo, recursos e reduz os impactos ambientais. Para cada calça jeans desta coleção cápsula foram usados até 7,4 litros de água na etapa de lavanderia. No processo usual, isto é, sem o apoio do software da empresa Jeanologia, são necessários cerca de 48,8 litros de água para realizar a lavagem de uma peça”, detalha Fernanda Campos.
Neste sentido, a tecnologia é uma grande aliada das varejistas que se propõem a fazer a confecção de roupas seguindo critérios ESG, uma vez que inovações são fundamentais para aprimorar, mensurar e monitorar processos e resultados.
“Quando falamos em inovação, a C&A é uma empresa Fashion Tech e, por isso, vem investindo e apostando em diferentes tecnologias e na transformação digital da sua operação. A inovação também faz parte dos processos de produção e deve estar alinhada aos critérios ESG. Em abril deste ano, demos mais um grande passo nesse sentido, sobretudo frente à sustentabilidade e ao monitoramento da nossa rede de fornecimento com a implantação da tecnologia blockchain junto aos nossos parceiros”, explica a diretora de RH, Pessoas & Inovação na C&A Brasil.
É a tecnologia blockchain que cumpre com o papel de integrar o sistema da C&A com o de seus fornecedores em tempo real, conferindo visibilidade para a produção de cada peça, do começo ao fim, de forma clara, ágil e prática. O uso do blockchain contribui ainda para a melhoria da gestão do processo de produção das coleções da varejista lado a lado aos seus fornecedores.
O investimento em tecnologia e inovação, aliás, é fundamental para que ações de sustentabilidade possam ser aplicadas na confecção de roupas sem afetar a qualidade das peças nem interferir no preço dos produtos. “Fazemos tudo isso demonstrando que fazer escolhas sustentáveis não precisa custar mais caro para o usuário final. Queremos continuar a ser a melhor escolha das clientes quando elas pensam em moda acessível, fashion, que as faça se sentir bem e é feita de forma responsável. Juntos, faremos a diferença no mundo, juntos, vamos vestir a mudança”, justifica.
Moda circular
Além de reduzir custos, investir e promover a reutilização ou a reciclagem das peças também faz parte das estratégias de ESG da indústria da moda.
Na C&A, por exemplo, desde 2017 existe o Movimento ReCiclo, que tem a função de coletar roupas usadas para que sejam doadas ou recicladas.
“Por meio desta iniciativa, a C&A disponibiliza, em mais de 170 lojas físicas, urnas para a arrecadação de roupas de qualquer marca, que poderão ser reutilizadas por meio de doação a instituições ou encaminhadas para reciclagem por um parceiro que faz a manufatura reversa das peças. Os tecidos são então enviados para desfibração e absorvidos em outras indústrias”, explica Fernanda Campos.
Desde o lançamento do projeto, a varejista já contabiliza mais de 123 mil peças de roupas, o equivalente a mais de 31 toneladas. “Deste total, 70% foram doados para reutilização e 30% foram reciclados. Somente de janeiro a abril deste ano, foram arrecadadas 19 mil peças”, conta a diretora de RH, Pessoas & Inovação na C&A Brasil.
Responsabilidade social ‘tá’ na moda
Mas não é só a sustentabilidade que faz parte das metas de grandes varejistas que querem se destacar no mercado competitivo e ganhar a preferência do consumidor. Iniciativas de dimensão social também contam pontos.
A C&A, por exemplo, mantém o Instituto C&A como um braço social da empresa há quase 30 anos, com a intenção de fortalecer comunidades por meio da moda com ações voltadas para organizações e pequenos negócios de moda em territórios periféricos, protagonizados pela comunidade LGBTQIA+, mulheres negras, refugiados e migrantes.
“Exemplo dessa sinergia entre a varejista e seu braço social, é a coleção cápsula de jaquetas jeans da C&A Brasil, lançada em setembro de 2020, em parceria com designers de cinco comunidades periféricas apoiadas pelo Instituto C&A. Na união entre a marca e o instituto social, demos visibilidade a artistas locais que foram convidados e remunerados para levar o seu trabalho para as lojas e site da C&A”, explica Fernanda Campos.